Como sabemos, qualquer interpretação é performativa. O seu dizer é um agir que traz o que é lido para o nível de um diálogo que a própria diferença das vozes dialogantes impede de dar por concluído. Ainda que pretendesse ser apenas ordenação de temas e imagens, no cumprimento desse seu propósito ela estaria desde logo a criar uma distância onde se torna visível a deslocação implícita em qualquer leitura. Mas as interpretações de Ruben A. que Dália Dias apresenta em A Escrita Dissidente desenvolvem-se desde o início com a consciência de que o respeito pela obra estudada está em aceitá-la como incitação ao pensamento, com todas as consequências que daí advêm.
Basta lermos o índice deste livro para verificarmos desde logo como ele se constrói no cruzamento de uma atenção à letra dos textos de Ruben A., à sua composição. Verifica-se também um interesse, a que podemos chamar teórico, por noções centrais de uma problemática da autobiografia, como as de autor e de assinatura, e outras que largamente a ultrapassam, como a da relação entre literatura e pintura, que atravessa persistentemente a obra de Ruben A., ou a da própria relação de uma escrita singular com os movimentos literários engendrados em bases onde se revelam similaridades que só um trabalho atento poderia tornar evidentes.