Sinopse
Três textos como três Reis Magos:
- um conto de Jorge de Sena, A Noite Que Fora de Natal;
- uma carta, Carta do Pai Natal, que o Pai Natal escreveu à filha de Mark Twain (e que
talvez tenha sido, afinal, da autoria do escritor);
- outro conto, Os Mortos, de James Joyce.
Três textos a rasgar a noite escura, cercados pelo silêncio e pela profunda satisfação que
vem da leitura.
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Autor(es)
James Joyce
James Joyce nasceu em Dublin a 2 de Fevereiro de 1882.
Era o mais velho de dez crianças de uma família que passou da prosperidade à quase pobreza. Teve acesso a uma educação privilegiada numa escola jesuíta e no University College de Dublin, onde deu provas do seu talento e cedo assumiu poses de genialidade. Aos 17 anos publicou, na Fortnightly Review, um longo estudo sobre Ibsen, autor que o levou a aprender norueguês. Em 1902 deslocou-se para Paris, com a intenção de estudar Medicina, projecto de que desistiu pouco depois para se dedicar à escrita de poemas e prosa. As obras de Dante, Shakespeare, Homero e Aristóteles despertaram o seu interesse.
Regressou a Dublin em Abril de 1903 devido à doença de sua mãe, que faleceria alguns meses depois.
No Verão de 1904 conheceu Nora Barnacle, uma jovem de Galway, que convenceu a acompanhá-lo para o Continente, onde planeava dar aulas de Inglês. O jovem casal passou alguns meses em Pola (actual Croácia) e, em 1905, deslocou-se para Trieste, onde, exceptuando uma estada em Roma e três viagens de Joyce a Dublin, viveram até Junho de 1915. Foi nesses períodos de separação que Joyce escreveu a Nora cartas abordando aspectos íntimos da sua vida sexual. Tiveram dois filhos, um rapaz e uma rapariga. Nora sentiu sempre uma admiração incondicional por Joyce, embora, ao que parece, nunca tenha lido nenhuma das suas obras.
O primeiro livro de poemas de Joyce, Música de Câmara, foi publicado em Londres em 1907, e Dublinenses em 1914.
A participação da Itália na Primeira Grande Guerra levou Joyce a deslocar-se para Zurique, onde se manteve até 1919. Durante este período publicou Retrato do Artista quando Jovem (1916) e Exílios (1918), uma peça teatral.
Depois de um breve retorno a Trieste no fim da guerra, Joyce decidiu voltar para Paris de modo a poder editar Ulisses, em que trabalhava desde 1914 (ao deixar a Irlanda, jurara escrever um livro com as «três armas» que lhe restavam, «o silêncio, o desterro e a subtileza»). A obra acabou por ser publicada, pela sua amiga Sylvia Beach, na Shakespeare & Company, em Paris, no dia do seu aniversário em 1922. Ulisses trouxe-lhe fama internacional, apesar de críticas negativas, como a de Virginia Woolf, que recusou publicá-lo na The Hogarth Press.
Como é sabido, o livro, de referências homéricas, recria um dia de Dublin, o 16 de Junho de 1904.
Em público Joyce era lacónico e distante. Numa carta a Nora definiu-se mesmo como «um homem ciumento, solitário, insatisfeito, orgulhoso». Tinha hábitos rígidos, comendo sempre no mesmo restaurante, em Paris, às nove horas. Quase todos os escritores que com ele se davam, com excepção de Djuna Barnes, o tratavam por Mr. Joyce. Em privado era mais expansivo, sobretudo em temas teológicos. Era supersticioso e as trovoadas apavoravam-no. Tinha problemas nos olhos e fez várias operações que não impediram que um glaucoma acabasse por cegá-lo.
Escreveu ainda Finnegans Wake, apesar da quase cegueira e das preocupações causadas pela doença mental da filha. Segundo Joyce, o livro, saído em 1939, daria que fazer aos críticos durante muitos anos. A obra, de difícil leitura e quase impossível tradução, foi recebida com frieza, o que amargurou os últimos anos de vida de Joyce.
No começo da Segunda Grande Guerra foi viver para França. Num escrito que lhe dedicou nessa época, Borges escreveu: «James Joyce, agora, vive num apartamento em Paris, com a sua mulher e os seus dois filhos. Vai sempre com os três à ópera, é muito alegre e muito conversador. Está cego.»
Em 1940, Joyce conseguiu permissão para regressar a Zurique. Aí faleceu a 13 de Janeiro de 1941, de uma úlcera perfurada. Estava prestes a fazer 59 anos e o seu génio literário era amplamente reconhecido. Está enterrado no Cemitério de Fluntern, em Zurique. A 16 de Junho, o Bloomsday, a Irlanda, com a qual teve sempre uma relação difícil, celebra-o como herói nacional.
Ler mais Mark Twain
Mark Twain foi baptizado à nascença, no ano de 1835, com o nome de Samuel Langhorne Clemens, que ficaria para sempre na sombra do seu pseudónimo. Filho de um advogado severo, terá sido a mãe a despertar‐lhe o sentido de humor, e é a ela que Twain dedica A Viagem dos Inocentes (livro que resulta do seu trabalho como correspondente), pela sua leitura «paciente» e «crítica caridosa». Twain começou por trabalhar como aprendiz de tipógrafo, em 1848, e alguns anos mais tarde já contribuía com artigos e histórias humorísticas para o jornal de um seu irmão, mas dedicou também alguns anos da sua vida a ser piloto de barcos. Foi num jornal do Nevada, com 27 anos, que nasceu a assinatura Mark Twain. As suas obras mais reconhecidas são As Aventuras de Tom Sawyer (1876) e As Aventuras de Huckleberry Finn (1884). Escritor muito citado, conta‐se entre as suas frases mais conhecidas o desmentido de notícias que anunciavam a sua morte, em 1897: As notícias da minha morte são manifestamente exageradas. Só em 1910 esse dia haveria de chegar.
Ler mais Jorge de Sena
Jorge de Sena nasce em Lisboa, a 2 de Novembro de 1919. Filho único, torna-se aos catorze anos o único sustento da família quando o pai, comandante da marinha mercante, sofre um acidente de trabalho que lhe custa a amputação de uma perna. Ingressa, em 1937, na Escola Naval, mas é expulso no ano seguinte, após uma viagem no navio-escola Sagres, como primeiro cadete. Porém, a experiência na Armada, à época da Guerra Civil de Espanha, e do crescimento do Estado Novo em Portugal, deixa marcas que viria a transpor para a sua obra. É o caso dos contos «Duas Medalhas Imperiais com Atlântico» [Andanças do Demónio, 1966], e «A Grã-Canária» [Os Grão-Capitães, 1976].
Acaba por seguir estudos em Engenharia Civil, curso que termina em 1944, no Porto. Já dera, porém, os primeiros passos na poesia, publicando o seu primeiro livro de poemas, Perseguição, em 1942, editado pelos Cadernos de Poesia. Em 1949, casa com Mécia de Freitas Leça, altura em que acumula as tarefas de engenheiro civil na Junta Autónoma de Estradas com as de tradutor, director-literário e revisor.
Em 1959, na sequência do seu envolvimento na tentativa de golpe de Estado, a 11 de Março, procura exílio no Brasil, onde lecciona primeiro Teoria da Literatura, e depois Literatura Portuguesa. Aí obtém o diploma em livre-docência, para o qual se naturaliza brasileiro, em 1963, e o doutoramento em Letras. São anos de grande produção para Jorge de Sena; investiga sobre o Maneirismo de Luís de Camões, estuda Fernando Pessoa, escreve peças de teatro e as obras Metamorfoses e Andanças do Demónio, onde se inclui inicialmente O Físico Prodigioso. Inicia a redacção de Sinais de Fogo.
O golpe militar no Brasil, em 1964, leva-o em busca de uma oportunidade para abandonar a instável situação política brasileira. Parte para os Estados Unidos em 1965, com Mécia de Sena e os nove filhos de ambos.
Jorge de Sena exerce nos Estados Unidos o cargo de professor catedrático do Departamento de Espanhol e Português, primeiro no Wisconsin, e mais tarde em Santa Barbara, na Califórnia, onde se manterá até ao fim da vida, a 4 de Junho de 1978.
Dizer que Jorge de Sena nos deixou uma obra de fôlego é, além de um cliché, dizer pouco. O Sena poeta legou-nos mais de vinte colectâneas de poesia; o Sena dramaturgo deixou-nos uma dezena de peças de teatro; na ficção, escreveu um romance autobiográfico e mais de trinta contos; o Sena professor, investigador e crítico deixou-nos cerca de quarenta volumes dedicados à crítica, ao ensaio, à história e teoria literária, ao teatro, ao cinema e às artes plásticas. Jorge de Sena foi ainda conferencista; director de publicações; coordenador editorial; consultor literário; e nos intervalos desta extensa produção, correspondeu-se com muitos outros escritores e intelectuais, deixando um importante legado epistolográfico.
O Sena tradutor confiou-nos as brilhantes traduções de ficção de autores como Faulkner, Hemingway, Graham Greene, Chestov, Erskine Caldwell, Evelyn Waugh, Eugene O’Neill ou André Malraux. E ainda duas grandes antologias de poesia universal, que editaremos brevemente na Maldoror, uma antologia da poesia de Emily Dickinson, e esta antologia da poesia de Cavafy, que Marguerite Yourcenar, também ela tradutora do poeta, considerava a mais perfeita de todas as traduções da poesia do grego de Alexandria.
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