Do reconhecimento do caráter libertador da palavra poética depende para Eduardo Lourenço um entendimento do crítico enquanto leitor passional. Este leitor recusa o gesto de julgar a obra a partir de uma instância superior, procurando acolher os seus ensinamentos, dar conta do seu movimento interno, iluminar o seu significado. Concebendo o papel singular da poesia, na esteira de Heidegger, como leitura privilegiada do mundo e aproximação à sua essência, caberá ao ensaísta ampliar o sentido dessa aproximação. O movimento de ampliação, em que o discurso crítico se apresenta como prolongamento da obra, implica a ideia de renovar permanentemente os seus pontos de partida.
[…] A aproximação ensaística à poesia, num movimento hermenêutico de escrita passional, não só não recusa como pressupõe mesmo um intenso e polémico diálogo com outras propostas de leitura crítica. Assumindo como evidência a ideia de que é o próprio comentário crítico que prolonga a obra, o ensaísmo lourenciano nasce precisamente deste diálogo, não surpreendendo por isso que os primeiros ensaios pessoanos escritos e publicados se debrucem principalmente sobre a crítica e não tanto sobre a obra em si. Trata-se, nesses primeiros ensaios, de denunciar certos excessos dogmáticos de alguns dos principais críticos, que teriam reduzido a estranheza de uma obra cuja singularidade era necessário preservar, mas também de ler atentamente os críticos e encontrar modos de integrar certas perspetivas, ainda que transfiguradas, nas suas próprias leituras.
[…] Todos os ensaios aqui reunidos são posteriores à publicação da primeira edição abrangente do Livro do Desassossego, em junho de 1982, cujo impacto resultou numa importante mudança de perspetiva nas leituras lourencianas, assinalada e comentada pelo autor. Esta mudança demonstra a capacidade do ensaísta de rever os seus pressupostos de leitura, em linha com a proposta de uma osmose entre a crítica e o seu objeto.
(Da introdução de Pedro Sepúlveda)
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Eduardo Lourenço
EDUARDO LOURENÇO (DE FARIA) nasceu a 23 de Maio de 1923, em S. Pedro de Rio Seco, concelho de Almeida, distrito da Guarda. Era o filho mais velho (de sete) de Abílio de Faria, oficial do Exército, e de Maria de Jesus Lourenço. Frequenta a Escola Primária na sua terra natal. Depois ingressa no Liceu da Guarda e termina os seus estudos secundários no Colégio Militar em Lisboa. Frequenta o Curso de Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra onde conclui a Licenciatura no dia 23 de Julho de 1946, com uma Dissertação com o título "O Sentido da Dialéctica no Idealismo Absoluto. Primeira parte". Assume as funções de Professor Assistente nessa Universidade, cargo que desempenha até 1953. Desde então e até 1958 exerce as funções de Leitor de Língua e Cultura Portuguesa nas Universidades de Hamburgo, Heidelberg e Montpellier. Nos anos de 1958 e 1959, rege, na qualidade de Professor Convidado, a disciplina de Filosofia na Universidade Federal da Baía (Brasil). Ocupa depois o lugar de Leitor a cargo do Governo francês nas Universidades de Grenoble e de Nice. Nesta última Universidade irá desempenhar posteriormente as funções de Maître-Assistant, cargo que manterá até à sua jubilação no ano lectivo de 1988-1989. Publica, em edição de autor, o seu primeiro livro Heterodoxia I em Novembro de 1949. Casa com Annie Salomon em 1954. Em 1966, nasce o seu filho adoptivo, Gil. Ao seu livro Pessoa Revisitado - Leitura Estruturante do Drama em Gente é atribuído o Prémio Casa da Imprensa (1974). Em 10 de Junho de 1981, é condecorado com a Ordem de Sant’Iago d’Espada. Pelo seu livro Poesia e Metafísica recebe, no ano de 1984, o Prémio de Ensaio Jacinto Prado Coelho. Dois anos mais tarde, é distinguido com o Prémio Nacional da Crítica graças a Fernando, Rei da nossa Baviera. Por ocasião da publicação da sua obra Nós e a Europa – ou as duas razões, é galardoado com o Prémio Europeu de Ensaio Charles Veillon, que distingue o conjunto da sua obra. Dirige, a partir do Inverno de 1988, a revista Finisterra - Revista de Reflexão e Crítica. É nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Roma. É condecorado com a Ordem do Infante D. Henrique (Grande Oficial). Recebe, no dia 1 de Julho de 1992, o Prémio António Sérgio. Participa no Parlamento Internacional de Escritores que decorre entre 28 e 30 de Setembro de 1994 em Lisboa. Pela sua obra O Canto do Signo recebeu em 1995 o Prémio D. Dinis de Ensaio. Doutor Honoris Causa pelas Universidades do Rio de Janeiro (1995), Universidade de Coimbra (1996), Universidade Nova de Lisboa (1998) e Universidade de Bolonha (2006). Exercia desde 2002 as funções de administrador não executivo da Fundação Calouste Gulbenkian. Foi galardoado com o Prémio Pessoa 2011 e ainda com o Prémio Vida e Obra (Sociedade Portuguesa de Autores) a que se sucederam, entre outros, o Prémio Universidade de Lisboa (2012), o Prémio Jacinto do Prado Coelho (2013) e o Prémio Vasco Graça Moura (2016).
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