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Sinopse

"A muito poucas pessoas que não eu deve — assim o espero — importar a minha vida particular, coisa que não gostaria de ter mas que afinal tenho, como quem veste um pijama para a travessia da noite — oh! estas minhas incorrigíveis alusões culturais — ou lava os dentes, pelo menos, ao começar o dia. No entanto, a minha suprema ambição — o meu ideal inatingível até porque ideal, mas sempre presente como um limite — longe de ser a figura de César ou mesmo a de Shakespeare (que, aliás, nos legou uma figura incomparável do ditador romano) — é a de um simples mineral, com a sua impassibilidade e a sua adesão à terra, a que acabarei por voltar não só por condição como por desejo profundamente, longamente sentido e só satisfeito no dia em que a minha voz passar a ser a voz da terra, mais importante, no fundo, do que todas as palavras que me houver sido dado proferir à sua superfície, ao longo da minha vida mais ou menos curta mas ao fim e ao cabo sempre curta, se encarada na perspectiva do destino do homem como espécie e da vida deste planeta como seu ambiente de sempre e para sempre."

Ruy Belo (excerto da introdução)

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Autor

Ruy Belo

Doutorado em Direito Canónico pela Universidade de S. Tomás de Aquino, em Roma, e licenciado em Filologia Românica e em Direito pela Universidade de Lisboa, lecionou no ensino secundário e foi leitor de Português na Universidade de Madrid. Foi diretor literário de uma editora; chefe de redação da revista Rumo; adjunto do Diretor do Serviço de Escolha de Livros do Ministério da Educação Nacional; bolseiro de investigação da Fundação Calouste Gulbenkian; tradutor de numerosos autores franceses e colaborador em várias publicações periódicas. Vítima de um edema pulmonar, a sua morte precoce, em 1978, colheu de surpresa uma série de escritores que lhe dedicam, no mesmo ano, uma Homenagem a Ruy Belo. Iniciada em 1961, mas mantendo-se, na confluência da poesia dos anos 50, equidistante quer de um dogmatismo neo-realista quer do excesso surrealista, mas incorporando aquisições dessas duas formas de comunicação estética, para António Ramos Rosa, «A poesia de Ruy Belo é uma incessante reflexão sobre o tempo e a morte e a incerta identidade do sujeito que em vão procura o lugar originário onde se encontraria o ser na sua totalidade [...]. A incerteza e uma profunda frustração, muitas vezes impregnada de uma trágica ironia, dominam esta procura do lugar ontológico e da degradação existencial». (Incisões Oblíquas, Lisboa, 1987, p. 66). Abarcando a crítica irónica da realidade social e a denúncia das diversas problemáticas que equacionam o homem, desde a sua vivência espiritual e religiosa até ao envolvimento concreto e existencial, a poesia de Ruy Belo é uma «forma de intervenção, de compromisso, de luta por um mundo melhor [...] sem [...] o poeta pactuar com a demagogia, com o oportunismo que afinal representa não ver primordialmente na arte criação de beleza, construção de objectos tanto quanto possível belos em si mesmos» («Nota do Autor» a País Possível, 1973).

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